Friday, December 22, 2006

O consumo nosso de cada dia... em dia de Natal


O consumo nosso de cada dia... em dia de Natal

http://gaia.org.pt/econatal/

As grandes firmas de relações públicas, de publicidade, de artes gráficas, de cinema, de televisão ... têm, antes de mais, a função de controlar os espíritos. É necessário criar "necessidades artificiais" e fazer com que as pessoas se dediquem à sua busca, cada um por si, isolados uns dos outros. Os dirigentes dessas empresas têm uma abordagem muito pragmática: "É preciso orientar as pessoas para as coisas superficiais da vida, como o consumo." É preciso criar muros artificias, aprisionar as pessoas, isolá-las umas das outras. (1)”

O consumo encontra-se instituído, na sociedade moderna e dita ocidental em que nos inserimos, como um valor cultural, como um elemento intrínseco ao(s) nosso(s) estilo(s) de vida e que nos caracteriza enquanto indivíduos. Na realidade, os princípios e práticas inerentes ao consumo, toda a sua dimensão sociológica e utilidade prática no seio do modelo ideológico neoliberal, passam ainda despercebidos à generalidade dos indivíduos e possuem uma preponderância crucial mas subliminar, profunda mas sonegada, na forma como os indivíduos se concebem (e são concebidos) enquanto seres sociais.

O consumo, por definição, é uma actividade que pressupõe a satisfação - geralmente por intermédio de uma troca financeira - de um conjunto de necessidades mais ou menos essenciais dos indivíduos. O cerne da questão é precisamente esse: quem é que determina o que é de facto uma necessidade essencial? Sendo todo o contexto social e cultural fulcral na forma como os seus valores são absorvidos - normalmente de uma forma inconsciente e automática - pela generalidade dos indivíduos, pode-se desde logo presumir que num contexto de acelerada globalização, em que o "American Way of Life" funciona como modelo cultural, social e económico homogenizador, também os conceitos a ele inerentes, como o do consum(ism)o, obedecem à mesma lógica de acentuada "mercantilização" da vida e das relações humanas à escala global.

Ou seja, a utilidade do consumo, numa lógica liberal, está muito longe de se esgotar nessa finalidade "básica" e até "anacrónica" de satisfação de necessidades essenciais à vida humana ou, eventualmente, nem será essa a sua finalidade mais fundamental: um dos principais propósitos do consumo será o de preencher todo o vazio social decorrente da eliminação das formas de socialização e de identidade colectiva anteriores à "revolução" neoliberal. Mais até do que preencher o vazio, a sua utilidade no seio do sociedade global é a de substituir - ele próprio - essas formas, condicionando os indivíduos no sentido de participarem socialmente de uma maneira extremamente conveniente para toda a dinâmica do sistema. Isso só é possível através de diversos mecanismos de comunicação e condicionamento de massas de entre os quais a publicidade será talvez o mais significativo, ou pelo menos um dos mais comuns.

Por outras palavras, de tão precário e volátil que o emprego se tornou, tendo a componente produtiva das empresas sido deslocada para países designados de 3ªmundo (onde estas ficam de forma quase plena a salvo de medidas protectoras dos direitos laborais e, por exemplo, leis de protecção ambiental) tendo a vida social, cultural e colectiva sido esvaziada de conteúdo por um paradigma de pensamento essencialmente economicista, nomeadamente seguindo
pressupostos de apropriação individual de bens materiais, resta ao indivíduo essa função de consumidor. O consumo enquanto princípio existencial, valor de pensamento e projecto de vida. O consumo enquanto meio e fim. Do ponto de vista económico, é um consumo ilimitado que permite manter as taxas de crescimento económico que se encontram na base de todo o sistema financeiro especulativo mundial, isto ao mesmo tempo que os recursos são cada vez mais escassos e, por muito que possa custar perceber, finitos ...

Uma pequena elite ávida de poder, ganância e zeros na conta bancária que continua, com a nossa conivência quase plena, a conduzir os destinos da quase totalidade da população mundial ao mesmo tempo que a Terra de todos nós, e de ninguém em particular, se continua a degradar por via de uma impiedosa exploração parasitária e insaciável.

O consumo possui hoje, portanto, um significado prático e sociológico primordial em todo um contexto determinado por um liberalismo adoptado à escala mundial: muito para além da sua função "pré-histórica" de satisfação de necessidades essenciais, actualmente, as supostas necessidades dos indivíduos - necessidades desde logo, muitas delas, artificialmente criadas pelos poderosos departamentos de marketing das principais corporações – são o pretexto ideal para reproduzir a disseminar o consumo enquanto instituição teológica, dogma cultural e mecanismo prático de alienação colectiva, mas por via de um crescente processo de feroz competição e estratificação individual materialista.

O consumo surge como conduta activa e colectiva, como coacção e moral, como instituição também. Compõe todo um sistema de valores, com tudo o que este termo implica enquanto função de integração do grupo e de controlo social. (2) Ao Domingo já não vamos à missa, vamos ao “shopping”.

Num contexto em que os mecanismos susceptíveis de modificar e configurar toda a conjuntura mundial se encontram, de uma forma ou de outra, apropriados por um conjunto restrito de poderosas corporações - detidas por um grupo restrito de indivíduos - e quando os mecanismos democráticos convencionais são cada vez menos representativos e cada vez mais inócuos - numa sociedade que tende para a homogeneização através desse propósito comum a todos que é o de consumir - um dos poucos fenómenos que parece, ainda, atribuir alguma importância ao indivíduo comum é, exactamente, o consumo. Enquanto consumidores somos teoricamente bajulados por todo o género de promoções e mimos publicitários, técnicas e tácticas de propaganda várias.

Aturdidos que estamos nesse "propósito colectivo" e paradoxalmente ferozmente individualizante que é o de consumir, a nossa consciência social, humana e ecológica é, sobremaneira, alienada e as próprias consequências inerentes ao consumo estão muito longe de ser percepcionadas por todos nós, elos cruciais que somos nas relações existentes entre as deploráveis condições produtivas nos sítios mais remotos do mundo (destruição de habitats naturais, situações de exploração laboral, mecanismos económicos de neocolonialismo) e as condições de consumo, sobretudo nos países economicamente mais poderosos, dado que somos nós que adquirimos esses produtos. Mas é importante salientar que também aí, nos países ditos desenvolvidos, existam enormes disparidades sociais e o próprio consumo não decorre de forma homogénea mas sim, e cada vez mais, é ele próprio sintomático da existência de estruturas socais piramidais, com enormes disparidades entre o topo e as bases.

Enquanto as “classes” do topo consomem produtos obscenamente luxuriosos e altamente ostentatórios, as classes das “bases” não deixam de poder participar no grande festim consumista liberal com uma cada vez maior proliferação de lojas de produtos chineses fabricados, por norma, em condições ambientais e laborais deploráveis. Mas no entanto baratos, e é isso que importa claro.

As repercussões de todo o sistema e do próprio consumo ao nível cultural também não são inestimáveis. Toda a nossa paisagem cultural, as cidades, as estradas, as ruas, os meios de comunicação, estão repletas de mensagens publicitárias induzindo mais e mais consumo. Um consumo obstinado, nada ético e que prejudica muito mais a vida e os seres vivos do que é realmente útil. Consumimos mais, muito mais, por consumir do que propriamente por necessitarmos de facto de satisfazer uma qualquer necessidade real, ou pelo menos uma necessidade que nos traga mais do que uma efémera sensação de felicidade.

Na economia mundial, os ricos tornam-se cada vez mais ricos. Vinte por cento do mundo consomem 80 por centro dos recursos - são dados do Banco Mundial. (O mundo) está cada vez mais nas mãos de 300 ou 400 famílias. Três famílias americanas - entre as quais a de Bill Gates - têm o equivalente ao produto nacional bruto, de cada ano, de 48 estados africanos que representam 600 milhões de pessoas. (3)

O que só demonstra esse propósito bem claro que o consumo adquire hoje, ou seja, o consumo do cidadão comum - cada vez mais restringido em termos de escolhas, dado que cada vez menos e mais poderosas corporações controlam cada vez mais sectores da economia - é o tributo que temos de pagar a esses novos senhores feudais globais. Isto os que podem pagar esse tributo mínimo e não se vêm atirados para o lodo da segregação social.

Como se não bastasse, e só para elucidar ainda melhor acerca da natureza doentia do consum(ism)o, a ONU calcula que o conjunto das necessidades básicas de alimentação, água potável, educação e cuidados médicos da população mundial poderia ser coberta com uma taxa de menos de 4% sobre a riqueza acumulada das 225 maiores fortunas. Satisfazer os requisitos básicos de água e saneamento de todo o mundo custaria apenas 13 biliões de dólares, sensivelmente, a mesma quantia que a população dos Estados Unidos e da União Europeia despende anualmente em perfume.(4)

A questão que urge colocar é como chegámos a este ponto de perversidade? Como é que chegamos a um ponto em que consideramos mais natural o nosso direito a adquirir produtos, mais ou menos, supérfluos de cosmética do que o direito de milhões de seres vivos a uma vida condigna?

Porque a preponderância do consumo apesar de bastante subliminar não é inocente, bem pelo contrário, nós, enquanto consumidores, possuímos uma importância muito relevante quando tomamos as decisões relativas àquilo que compramos e que utilizamos. Por vezes “pequenas” grandes opções podem, de facto, fazer bastante diferença. Existem diferenças enormes entre adquirirmos um produto fabricado na China em condições, em grande parte dos casos, deploráveis e de manifesta exploração laboral e ambiental, e um produto fabricado, por exemplo, localmente em condições das quais temos boas possibilidades de estar informados. Por quem, em que condições, com que materiais, em suma: com que pegada ecológica e social?

Em Portugal, país onde a proliferação de grandes centros comerciais e afins não cessa de aumentar, a fúria consumista é particularmente selvagem e alienadora, com os apelos e induções agressivas ao consumo a aumentaram ao mesmo ritmo que as condições sociais e também ambientais se deterioram de forma muito acentuada, mesmo que esse consumo mais não signifique do que alienação colectiva, destruição e enorme desgaste de habitats naturais, assim como lucros chorudos para grandes corporações empresariais ao mesmo tempo que o comum trabalhador é cada vez mais precário e explorado.



O Natal,



Numa época natalícia, em que o aliciamento ao consum(ism)o adquire contornos de verdadeiro fenómeno de psicose colectiva, urge lançar as bases de reflexão sobre aquilo que nós próprios somos enquanto seres sociais. Será que vamos, em letárgicas visitas aos hipermercados ou mega centros comerciais, continuar a aceitar o papel de meros consumidores apáticos, e reduzir toda as nossas dimensões pessoais, sociais, humanas a uma mera escala de bens materiais que nos pretendem fazer crer ser essenciais para a nossa vida e felicidade?

Será que não podemos acreditar que uma sociedade que se designa por "de consumo", ou seja, descartável, despojada de conteúdo, desumana, se torne numa sociedade bem mais igualitária, fraterna e solidária para todos os seres?

A mudança começa em cada um de nós, na forma como pensamos, agimos e, cada vez mais, na forma como compramos também. Apesar de ser para nós a mais comum, a verdade é que existem muitas outras formas de satisfazer as nossas necessidades mais elementares, algumas delas até sem recurso ao acto de comprar propriamente dito. Possibilidades como a auto-produção, a troca, aprendermos a viver mais e mais com menos apesar de não tanto conhecidas não deixam por isso de ser menos válidas. Mesmo comprando, há muitos possibilidades de o fazermos de forma mais reflectida e moderada, nomeadamente recorrendo a modelos de comércio alternativo, nomeadamente Comércio Justo, Produtos Ecológicos e reutilizados, feitos de materiais reciclados, instituições não governamentais, sistemas de crédito não monetário, comércio de pequena escala e familiar, comércio tradicional. Originalmente o dinheiro seria como um meio intermediário das trocas comerciais. Gradualmente, e sobretudo no âmbito da nova ordem liberal, tem-se vindo a tornar num fim cada vez mais obstinado capaz de nos tornar totalmente dependentes e egoístas.

Não é por isso de admirar que, justamente em nome do dinheiro, os nossos comportamentos de consumo sejam em larga medida “irresponsáveis” e artificialmente ampliados, sem que nada disso nos traga uma felicidade que não uma meramente ilusória. É tempo de comprarmos somente aquilo que verdadeiramente necessitamos para nos podermos sentir felizes, de comprarmos somente os produtos que por detrás da publicidade, das prateleiras repletas de mil cores, das promoções e mais promoções, têm uma verdadeira história da qual se podem orgulhar, e não uma história das que chegam até nós muito mal contadas e até totalmente sonegadas: de milhares de trabalhadores do dito terceiro mundo praticamente escravizados, de multinacionais gananciosas e obstinadas em controlar o comércio mundial, de habitats naturais completamente devastados. Histórias que nós não queremos mais ouvir e ser coniventes. Podemos ser nós próprios, no simples acto de comprar, a escrever uma nova história bem mais bonita, bem mais humana, bem mais de acordo com o mundo, que no mais íntimo de nosso coração, nos atrevemos a conceber e sonhar. Todo o mundo é composto de mudança, e a mudança somos nós próprios, nós somos a mudança que queremos ver no mundo!

Para um Natal diferente, um site repleto de ideias e criatividade para um Natal não consumista e verdadeiramente natalício:

http://gaia.org.pt/econatal/

A propósito do consumo e da globalização, consumo e publicidade um livro absolutamente essencial: No Logo, de Naomi Klein, ed: Relógio de Água

(1) Chomsky, Noam. Duas horas de lucidez. Mem Martins, Editorial Inquérito.
(2) Baudrillard, J. (1996). A sociedade de consumo. Lisboa, Edições 70.
(3) Zanotteli cit. in. Marujo, A. (2003). Missionário "mais incómodo" de Itália quer igreja empenhada contra armamento, Público, nº4671 / 5 de Janeiro de 2003, pp. 21.
(4) Ramonet, I. (1998). The politics of hunger. [Em linha]. Disponível em <
http://mondediplo.com/1998/11/01leader>. [Consultado em 10/01/2003].

versão inicial publicada em: http://pt.indymedia.org/ler.php?numero=29302&cidade=1


Tuesday, December 19, 2006

A Consciência da Massa


A Cris deu-me a descobrir um texto que, de forma tão primordial, foi capaz de exprimir em verbos, palavras, pensamentos com os quais tão frequentemente me encontro e reencontro sem ser muito capaz de os fazer-se manifestar ... abordei-os em “Be the Change” e foram até cruciais na forma como se estruturou todo o projecto ... no fundo andam “à volta” daquilo que são os padrões “normalizados” de pensar, no que são as normas sociais e culturais da sociedade em que nos inserimos e suas múltiplas implicações ...


Pessoalmente, tenho a convicção de que quando a humanidade atinge este ponto de desumanidade é tempo de parar para pensar naquilo em que nos tornámos e, sobretudo, colocar em causa aqueles que são os padrões de pensamento dominantes. Foi isso que uma grande parte dos portugueses, se calhar a maioria, não fez durante a ditadura fascista, e por isso mesmo tivemos todos aqueles anos de fascismo retrógrado e reaccionário. Foi isso que provavelmente a maior parte dos alemães não fez durante o nazismo. Foi isso que talvez uma grande parte dos soviéticos não fez durante o regime totalitário estalinista. É isso que talvez uma grande parte de nós não faça hoje numa época de acentuado liberalismo económico onde por vezes é mais legítimo um milionário ter uma piscina repleta de água para as suas festas “socialite” do que milhares de pessoas matarem a sede. Vivemos uma época onde se aceita com enorme “naturalidade” a escala de desigualdades e mesmo a “desumanidade” a que chegámos. A perda de vidas humanas, ainda que causada por motivos que muitas vezes se prendem com a enorme injustiça social que existe e uma criminosa distribuição de recursos, é para nós como que banal e aceite de forma totalmente passiva.

Talvez seja tempo de parar para pensar. De parar para pensar em que mundo é que queremos viver e se este está tão bem quanto nos parece (enquanto tivermos consola de vídeo jogos, automóvel e dinheiro para ir às compras no centro comercial).”


in Pereira, Pedro Jorge; “Be the Change you Want to See - uma outra perspectiva do mundo através do voluntariado”, (Porto, Planeta Terra: GAIA, 2006) p.52


A Consciência da Massa

por Nuno Michaels

http://www.nunomichaels.com/


Uma das verdades mais fundamentais - e no entanto mais difíceis de compreender - é a de que as pessoas vivem todas em diferentes níveis de consciência.

Não se assimila esse Ensinamento nas suas mais profundas implicações apenas lendo ou pensando sobre ele; há que observar a maneira como as pessoas agem, pensam, falam, sentem, reagem, vivem. O que lhes ocupa o pensamento. Como usam o tempo. O que as preocupa. Os objectivos que têm na vida. Aquilo de que falam. E então torna-se evidente que todas vivem em diferentes níveis de consciência e, até, o nível de consciência em que vivem.

A grande maioria da Humanidade vive num nível biológico-social instintivo. Nesse nível, as pessoas são condicionadas pelos valores vigentes e pela mentalidade comum. As suas identidades são uma mera extensão das normas, crenças, costumes e tabus da sociedade em que nasceram. Vivem polarizadas na sobrevivência e, se possível, na acumulação de dinheiro, poder e estatuto. No mínimo, precisam de um emprego seguro e um parceiro para acasalar e reproduzir-se. Odeiam a solidão.

Não têm ideias ou pensamentos originais; falam do que toda a gente fala, têm as opiniões que os meios de comunicação, os líderes de opinião e o status quo querem que tenham. Lêem jornais desportivos e revistas sobre programas de televisão, falam sobre pessoas e acontecimentos triviais do dia-a-dia. Gostariam que o mundo mudasse mas não começam por si próprios. Não questionam o que lhes é dito; se os seus líderes lhes dizem que os afegãos são maus e os astrólogos mentirosos, então os afegãos são maus e os astrólogos mentirosos. Assim, bovinamente, sem sequer investigarem o assunto. Consomem bens e serviços de que não precisam de facto e cujo único valor é o próprio acto de serem adquiridos e o estatuto que lhes está associado - na ilusão de que serão mais no dia em que tiverem mais.

Vivem vidas inteiras repetindo os mesmos padrões mentais e emocionais, submersos na sua própria subjectividade e incapazes de se verem objectivamente. Não fazem ideia do que são "energias", "arquétipos" ou "padrões". Não fazem ideia de que a vida é um processo de crescimento e desenvolvimento pessoal e não uma luta pela sobrevivência.

São os autómatos de que o sistema precisa para assegurar a sua reprodução e a manutenção das suas próprias estruturas. Constituem a "consciência da massa".

Libertarmo-nos da consciência da massa tem um preço muito alto. Porque os valores da sociedade são redutores, mas dão segurança - a mesma segurança que um rebanho dá a uma ovelha.

Evoluir para outro nível de consciência implica questionar e pensar por si mesmo; implica ser incompreendido e ridicularizado por quem não vê mais longe. Implica conviver com as conversas ocas, mecânicas, de quem nos rodeia. Implica ser livre. E a sociedade não gosta de indivíduos livres, porque são uma falha no sistema e um mau exemplo para os autómatos - e esses é que fazem falta, para que tudo isto funcione..."

Nuno Michaels
http://www.nunomichaels.com/


Monday, December 18, 2006

a Cidade


*Improviso ordinário sobre a Cidade Maravilhosa*


Uma cidade é

um amontoado de gente sem terra.

Antes não, nem tanto, antes

havia quintal e no Campo de Santana

as negras lavadeiras

estendiam na grama a roupa enxaguada.

Ah, que saudades de ver roupa na grama!

Já não,

já não que a lira tenho desatinada

e a voz enrouquecida

e não do canto

mas de ver que venho

falar de uma cidade endurecida,

falar de uma cidade poluída

falar de uma cidade

onde a vida é

cada dia menos do que a vida:

asfalto asfalto asfalto

e mais assalto

na Tijuca, na Penha, na Avenida

Nossa Senhora de Copacabana

em pleno dia.

Uma cidade

é um amontoado de gente que não planta

e que come o que compra

e pra comprar se vende.


[passagem de poema de Ferreira Gullar, Na Vertigem do Dia]



Saturday, November 25, 2006

Dia Sem Compras - o consumo nosso de cada dia...











o consumo nosso de cada dia...

As grandes firmas de relações públicas, de publicidade, de artes gráficas, de cinema, de televisão ... têm, antes de mais, a função de controlar os espíritos. É necessário criar "necessidades artificiais" e fazer com que as pessoas se dediquem à sua busca, cada um por si, isolados uns dos outros. Os dirigentes dessas empresas têm uma abordagem muito pragmática: "É preciso orientar as pessoas para as coisa superficiais da vida, como o consumo." É preciso criar muros artificias, aprisionar as pessoas, isolá-las umas das outras. (1)

O consumo encontra-se instituído, na sociedade moderna e ocidental em que nos inserimos, como um valor cultural, como um elemento intrínseco aos nossos estilos de vida e que nos caracteriza enquanto indivíduos. Na realidade, os princípios e práticas inerentes ao consumo, toda a sua dimensão sociológica e utilidade prática no seio do modelo ideológico neoliberal, passam ainda despercebidos à generalidade dos indivíduos e possuem uma preponderância crucial mas subliminar, profunda mas sonegada, na forma como os indivíduos se concebem (são concebidos) enquanto seres sociais.

O consumo, por definição, é uma actividade que pressupõe a satisfação - geralmente por intermédio de uma troca financeira - de um conjunto de necessidades, mais ou menos, essenciais dos indivíduos. O cerne da questão é precisamente esse: quem é que determina o que é de facto uma necessidade essencial? Sendo todo o contexto social e cultural fulcral na forma como os seus valores são absorvidos, normalmente de uma forma inconsciente e automática, pela generalidade dos indivíduos, desde logo, pode-se presumir que num contexto de acelerada globalização, em que o "American Way of Life" funciona como modelo cultural, social, económico homogenizador, também os conceitos a ele inerentes, como o do consumo, obedecem à mesma lógica de acentuada "mercantilização" da vida e das relações humanas à escala global.

Ou seja, a utilidade do consumo, numa lógica liberal, está muito longe de se esgotar nessa finalidade "básica" e até "anacrónica" de satisfação de necessidades essenciais à vida humana ou, eventualmente, nem será essa a sua finalidade mais fundamental: um dos principais propósitos do consumo será o de preencher todo o vazio social decorrente da eliminação das formas de socialização e de identidade colectiva anteriores à "revolução" neoliberal. Mais até do que preencher o vazio, a sua utilidade no seio do sociedade global é a de substituir - ele próprio - essas formas, condicionando os indivíduos no sentido de participarem socialmente de uma maneira extremamente conveniente para toda a dinâmica do sistema. Esse condicionamento só é possível através de diversos mecanismos de comunicação e condicionamento de massas de entre os quais a publicidade será o mais significativo.

Por outras palavras, tão precário e volátil que o emprego se tornou, tendo a componente produtiva das empresas sido deslocada para países designados de 3ªmundo, tendo a vida social, cultural e colectiva sido esvaziada de conteúdo por um paradigma de pensamento essencialmente economicista, nomeadamente seguindo
pressupostos de apropriação individual de bens materiais, resta ao indivíduo essa função de consumidor. O consumo enquanto princípio existencial, valor de pensamento e projecto de vida. O consumo enquanto meio e fim. Do ponto de vista económico, é um consumo ilimitado que permite manter as taxas de crescimento económico que se encontram na base de todo o sistema financeiro especulativo mundial, isto ao mesmo tempo que os recursos são cada vez mais escassos e, por muito que possa custar perceber, finitos ...

O consumo possui hoje, portanto, um significado prático e sociológico primordial em todo um contexto determinado por um liberalismo adoptado à escala mundial: muito para além da sua função "pré-histórica" de satisfação de necessidades essenciais, actualmente, as supostas necessidades dos indivíduos - necessidades desde logo, muitas delas, artificialmente criadas pelos poderosos departamentos de marketing das principais corporações – são o pretexto ideal para reproduzir a disseminar o consumo enquanto instituição teológica, dogma cultural e mecanismo prático de alienação colectiva, mas por via de um crescente processo de feroz competição e estratificação individual materialista.

O consumo surge como conduta activa e colectiva, como coacção e moral, como instituição. Compõe todo um sistema de valores, com tudo o que este termo implica enquanto função de integração do grupo e de controlo social. (2) Num contexto em que os mecanismos susceptíveis de modificar e configurar toda a conjuntura mundial se encontram, de uma forma ou de outra, apropriados por um conjunto restrito de poderosas corporações - detidas por um grupo restrito de indivíduos - e quando os mecanismos democráticos convencionais são cada vez menos representativos e cada vez mais inócuos, numa sociedade que tende para a homogeneização - através desse propósito comum a todos que é o de consumir -, um dos poucos fenómenos que parece, ainda, atribuir alguma importância ao indivíduo comum é, exactamente, o consumo. Enquanto consumidores somos teoricamente bajulados por todo o género de promoções e mimos publicitários, técnicas e tácticas de propaganda.

Aturdidos que estamos nesse "propósito colectivo" e paradoxalmente ferozmente individualizante que é o de consumir, a nossa consciência social, humana e ecológica é, sobremaneira, alienada e as próprias consequências inerentes ao consumo estão muito longe de ser percepcionadas por todos nós, elos cruciais que somos nas relações existentes entre as deploráveis condições produtivas nos sítios mais remotos do mundo (destruição de habitantes naturais, situações de exploração laboral, mecanismos económicos de neocolonialismo) e as condições de consumo, sobretudo nos países economicamente mais poderosos, dado que somos nós que adquirimos esses produtos. Mas é importante salientar que também aí, nos países ditos desenvolvidos, existam enormes disparidades sociais e o próprio consumo não decorre de forma homogénea mas sim, e cada vez mais, é ele próprio sintomático da existência de estruturas socais piramidais, com enormes disparidades entre o topo e as bases.

Enquanto as “classes” do topo consomem produtos obscenamente luxuriosos e altamente ostentatórios, as classes das “bases” não deixam de poder participar no grande festim consumista liberal, com uma cada vez mais proliferação de lojas de produtos chineses fabricados, por norma, em condições ambientais e laborais deploráveis.

As repercussões de todo o sistema e do próprio consumo ao nível cultural também não são inestimáveis. Toda a nossa paisagem cultural, as cidades, as estradas, as ruas, os meios de comunicação, estão repletas de mensagens publicitárias induzindo mais e mais consumo. Um consumo obstinado, nada ético e que prejudica muito mais a vida e os seres vivos do que é realmente útil. Consumimos mais, muito mais, por consumir do que propriamente por necessitarmos de facto de satisfazer uma qualquer necessidade real, ou pelo menos uma necessidade que nos traga mais do que uma efémera sensação de felicidade.

Na economia mundial, os ricos tornam-se cada vez mais ricos. Vinte por cento do mundo consomem 80 por centro dos recursos - são dados do Banco Mundial. (O mundo) está cada vez mais nas mãos de 300 ou 400 famílias. Três famílias americanas - entre as quais a de Bill Gates - têm o equivalente ao produto nacional bruto, de cada ano, de 48 estados africanos que representam 600 milhões de pessoas. (3)

O que só demonstra esse propósito bem claro que o consumo adquire hoje, ou seja, o consumo do cidadão comum - cada vez mais restringido em termos de escolhas, dado que cada vez menos e mais poderosas corporações controlam cada vez mais sectores da economia - é o tributo que temos de pagar a esses novos senhores feudais globais. Isto os que podem pagar esse tributo mínimo e não se vêm atirados para o lodo da segregação social.

Como se não bastasse, e só para elucidar ainda melhor acerca da natureza doentia do consum(ism)o A ONU calcula que o conjunto das necessidades básicas de alimentação, água potável, educação e cuidados médicos da população mundial poderia ser coberta com uma taxa de menos de 4% sobre a riqueza acumulada das 225 maiores fortunas. Satisfazer os requisitos básicos de água e saneamento de todo o mundo custaria apenas 13 biliões de dólares, sensivelmente, a mesma quantia que a população dos Estados Unidos e da União Europeia despende anualmente em perfume.(4)

A questão que urge colocar é como chegámos a este ponto de perversidade? Como é que chegamos a um ponto em que consideramos mais natural o nosso direito a adquirir produtos, mais ou menos, supérfluos de cosmética do que o direito de milhões de seres vivos a uma vida condigna?

Porque a preponderância do consumo apesar de bastante subliminar não é inocente, bem pelo contrário. No dia 25 de Novembro celebra-se a nível mundial o Buy Nothing Day, ou seja, "Dia sem compras", naquilo que constitui um desafio à abstinência em relação ao consumo por 24 horas, com um propósito global mais amplo que é, precisamente, o de gerar um processo de reflexão colectiva capaz de questionar os modelos de pensamento deshumanizantes e perversos associados ao consumo. Nomeadamente, reflectir sobre a forma despótica e silenciosa como ele se apoderou das nossas vidas e das relações humanas.

Portugal, país onde a proliferação de grandes centros comerciais e afins não cessa de aumentar, a fúria consumista é particularmente selvagem e alienadora, com os apelos e induções agressivas ao consumo a aumentaram ao mesmo ritmo que as condições sociais se deterioram brutalmente. Por esse motivo, e por todas as questões que lhe estão associadas que urge suscitar, o Dia Sem Compras pretende ser um ponto de partida para uma sociedade diferente.

Numa época pré-natalícia, em que o aliciamento ao consum(ism)o adquire contornos de verdadeiro fenómeno de psicose colectiva, o que se pretende é lançar bases de reflexão sobre aquilo que nós próprios somos enquanto seres sociais. Será que vamos, em letárgicas visitas aos centros comerciais, continuar a aceitar o papel de meros consumidores, e reduzir toda as nossas dimensões pessoais, sociais, humanas a uma mera escala de bens materiais que nos pretendem fazer crer ser essenciais para a nossa vida e felicidade?

Será que não podemos acreditar que uma sociedade que se designa por "de consumo", ou seja, descartável, despojada de conteúdo, desumana, se torne numa sociedade bem mais igualitária, fraterna e solidária para todos os seres?

Uma questão, entre tantas outras, a ser lançada no Dia Sem Compras.

mais informação sobre o Dia Sem Compras em:

http://www.gaia.org.pt/?q=node/797

A propósito do consumo e da globalização um livro absolutamente essencial: No Logo, de Naomi Klein, ed: Relógio de Água

(1) Chomsky, Noam. Duas horas de lucidez. Mem Martins, Editorial Inquérito.
(2) Baudrillard, J. (1996). A sociedade de consumo. Lisboa, Edições 70.
(3) Zanotteli cit. in. Marujo, A. (2003). Missionário "mais incómodo" de Itália quer igreja empenhada contra armamento, Público, nº4671 / 5 de Janeiro de 2003, pp. 21.
(4) Ramonet, I. (1998). The politics of hunger. [Em linha]. Disponível em <
http://mondediplo.com/1998/11/01leader>. [Consultado em 10/01/2003].


Thursday, November 16, 2006

For a Nuclear free world















Numa sociedade onde a apatia e resignação são muito generalizadas, quase que seria impossível deixar de me sentir muito entusiasmado com as notícias que chegam da Alemanha da mobilização de pessoas, movimentos, jovens ... contra aquele que é um dos “negócios” mais “sujos” do nosso planeta: a energia nuclear ... é inconcebível como se produzem resíduos para os quais não existe qualquer solução, que serão um legado cancerígeno para os nossos filhos durante centenas de anos ... também em portugal surgem alguns profectas tecnocratas e gananciosos a apregoar a “inevitabilidade” da opção nuclear ... opção? Que sentido de humor...

Ai quem me dera estar ao lado daqueles activistas nos “bloqueios Castor” ... e mais ainda, quem me dera que eles não fossem necessários, que pudessemos viver num mundo “limpo” do cancro nuclear ... e o que nos impede de lutar por isso? De exigir o nosso primordial direito a isso? Ou quem nos impede? São os tecnocratas? Os políticos? A polícia? Ou todos nós que ficamos sentados em casa confortavelmente no sofá em vez de nos sentarmos ao lado daquela gente linda nos bloqueios “Castor” ?

Imagens que tocam:

http://www.indymedia.org.uk/en/2006/11/355633.html


Wendland, Germany: Resisting Castor Nuclear Transport [en]

http://www.indymedia.org.uk/en/2006/11/355633.html


((i)) | 09.11.2006 23:22 | Climate Chaos | Ecology | World


From Friday 10th of November, around 20,000 German police were mobilised to guard the transportation of highly radioactive nuclear waste from France to Germany [Map] in containers called "Castor". The destination was Gorleben a village in northern Germany in a region called the Wendland. Protest actions took place throughout France and Germany, especially on Sunday along the last 50 kilometres of the route on rail, and on the early hours of Monday during the final 20 kilometres by road. For many activists this years Castor transport was a prelude to the protests against the next G8 summit in Germany in June 2007, where many groups call for blockades motivated by past experiences in the Wendland.


Monday, November 06, 2006

“Transe”











Já há bastante tempo que um filme não me tocava de forma tão “visceral” e me infundia emoções tão profundas e, de certa forma, perturbadoras. Transe, sem ser propriamente um filme documental (mesmo expondo de forma tão inexorável o drama do tráfico de “carne humana”), é um perturbante (é o mínimo que se pode dizer) testemunho de uma “tragédia” quotidiana que é a exploração da miséria de milhares, milhões até, de raparigas e mulheres neste nosso planeta... milhões de rapariguinhas (algumas delas ainda mal “despedidas” de uma fugidia infância) que, face à miséria de suas vidas, poucas mais perspectivas lhes restam do que agarrarem-se à ténue esperança de um emprego num qualquer país “rico”. E face à miséria também económica dos seus países de origem, até um país pobre, como por exemplo Portugal, consegue passar por país rico... Como nos oferece paradoxos tão interessantes a ordem neoliberal em que habitamos ...

Transe é um verdadeiro soco no estômago. Um soco no estômago que em larga medida é importante levarmos, sobretudo no sentido de despertar para um drama que tem a exacta escala de cada um dos seres humanos, sobretudo mulheres, de que os seus contornos se revestem ...

E creio que é essa sobretudo a dimensão mais essencial em “Transe”: a escala individual e pessoal dessa mesma tragédia e calamidade neo-esclavagista que uma sociedade essencialmente chauvinista e patriarcal persiste em reproduzir, alimentar, ignorar ... e dela todos nós somos cúmplices com o nosso silêncio, com a nossa indiferença, com a nossa insensibilidade para o drama que se desenrola mesmo ao nosso lado, numa das boates da nossa cidade nocturna, na rua, seja onda for... porquê?

No livro acabei por abordar a questão de uma forma algo lacónica talvez pela dimensão da questão em causa, mas acima de tudo pareceu-me relevante deixar essa reflexão ... “aquela” mulher que vemos nas ruas, nas boates, na berma da estrada, é um ser humano ... um ser humano, apesar de tudo, com a sua personalidade, identidade e sonhos, que numa grande parte dos casos será bem diferente do pesadelo da prostituição ... e uma “puta” não é somente uma “puta”, uma “puta” é uma rapariguinha, uma mulher, um ser humano ...

um parágrafo mais “dedicado” à reflexão sobre o conceito de “turismo de massas”, mas de qualquer das formas, creio que a exploração de milhares de raparigas, a prostituição, não deixa de ser uma das vertentes mais relevantes do “fenómeno” do turismo de masas ...

Estive a falar com a Joana, uma das responsáveis da agência nacional checa do programa juventude, sobre o país e particularmente Praga. Com a vulgarização dos voos “low-cost”, Praga começou a ser invadida de multidões ainda maiores de turistas, alguns dos quais somente para o fim-de-semana. A indústria do turismo de massas e outras que lhe estão inerentes: alcool, prostituição e drogas sofreu um “boom” de tal forma significativo que ocorreu uma enorme descaracterização na própria estrutura histórico-cultural da cidade, proliferando os bordeis, casas de sexo várias, lojas de bebidas alcoólicas e outras lembranças próprias de turismo de massas. O turismo, de uma oportunidade de promover a interculturalidade e aprendizagem a este nível, torna-se em algo que essencialmente torna cidades inteiras em parques de diversões para multidões de turistas. Quando era mais novo, fui várias vezes com os meus pais para o sul de Espanha e lá o turismo era bastante assim ... com um monte de “benidorms” espalhadas ao longo de toda a costa, com uma total descaracterização aos mais diversos níveis: ambiental, cultural, etnográfica. Infelizmente Portugal também não é muito diferente, basta observar no que o Algarve se tornou.

Praga é uma cidade particularmente bela, e não é propriamente agradável vê-la infestada desses turistas à procura de diversão barata, regada por litros de bebidas alcoólicas e muito sexo ... sendo as mulheres tratadas como um autêntico pedaço de carne que se paga para usar e abusar.”


in Pereira, Pedro Jorge; “Be the Change you Want to See - uma outra perspectiva do mundo através do voluntariado”, (Porto, Planeta Terra: GAIA, 2006) p.156


Transe” - (FRA/ITA/POR/RUS) 2006 126 min – Teresa Villaverde . Ana Moreira, Viktor Rakov, Robinson Stévenin

http://www.clapfilmes.pt/transe/

A história de Sónia, uma mulher de 20 e poucos anos que abandona o namorado e a família, em São Petersburgo, na Rússia, e decide partir sem olhar para trás para tentar encontrar uma vida melhor noutro país. Sónia vai conhecer a ilusão de uma vida nova e o inferno daqueles a quem a vida parece nada ter para dar. Fazendo a sua "via sacra" Europa fora, atravessando todo o continente, primeiro pela Alemanha, depois Itália, para acabar no extremo oposto, em Portugal, ela vai conhecer toda a miséria e degradação que o tráfico e a exploração dos mais fracos provoca. Um filme sobre a exploração e o tráfico de mulheres que a realizadora Teresa Villaverde ("Os Mutantes") explica a partir das palavras de Santa Teresa de Ávila: "O inferno é um cão a ladrar lá fora". "Estamos no início do século XXI e o cão ladra em toda a parte. Não nos livrámos da tortura, da escravatura, do genocídio. A personagem central deste filme vê esse inferno de frente e de muito perto. Penso que não chega a entrar, porque é preciso fazer parte do inferno para estar lá dentro. Ela não faz parte, mas não há saída. Jorge Semprún escreveu a propósito da sua experiência num campo nazi que um dos motores da sobrevivência é a curiosidade. Se não quisermos olhar, as chamas agigantam-se."

Saturday, November 04, 2006

GAIA lança A HERANÇA : Dia 4 e 10 de Novembro. O tempo de mudança é AGORA!








http://www.gaia.org.pt/


4 de Novembro

Dia Mundial contra as Alterações Climáticas

Relembramos neste dia Mundial contra as Alterações Climáticas a necessidade de preservar a herança de vida, que é este nosso planeta azul.


10 de Novembro

Dia Mundial contra a Shell


Ken Saro-Wiwa foi um escritor, poeta e produtor de televisão na Nigéria.

Quando assumiu funções de presidente do Movimento para a Sobrevivência do Povo Ogoni (MOSOP), uma das etnias que vivem no delta no rio Níger, Wiwa lutou pela defesa dos direitos dos 550 mil habitantes da região.

A HERANÇA - “O Mundo dos nossos Filhos”











A HERANÇA -

O Mundo dos nossos Filhos”

por Pedro Fontoura


http://www.gaia.org.pt/?q=node/697


A Terra é uma excepção.

Em todo o sistema solar ela é, até onde sabemos, o único planeta habitado.

Nós, humanos, somos uma entre milhões de espécies separadas que povoam um mundo que transborda de vida.

No entanto, a maior parte das espécies que existiram já não existem.

Depois de terem proliferado durante 180 milhões de anos os dinossauros foram extintos até ao último. Não ficou nenhum para contar a sua história.

Existem hoje algumas teorias, relativamente ao seu desaparecimento, que apontam como causa da sua extinção o facto destes espécimes, com um forte potencial evolutivo e uma adaptação fantástica ao seu ambiente, terem esgotado os recursos do mundo que os viu nascer... e mais tarde padecer e perecer.

Talvez o acidente crítico na história dos répteis ancestrais não tenha sido o choque de um corpo celeste com este planeta azul – o nosso templo vivo – mas sim o embater de uma espécie desmesuradamente “faminta” que não teve a “inteligência” de gerir um mundo pré-histórico que se tornou insustentável.


Os anos passaram. Já não são os dinossauros que habitam este planeta.

Existe uma nova espécie com uma fome igualmente desmesurada.

Temos em acréscimo algo a que chamamos inteligência.

Contudo, em vez de a usar-mos para sustentar as nossas necessidades de sobreviver e partilhar o conhecimento que ela nos proporciona, alimentamo-nos do sangue negro do corpo do nosso planeta que padece: o petróleo.

Movemo-nos como detentores de um reino de que não somos senhores mas apenas convidados, apresentando-nos como uma ameaça para todas as espécies existentes, e em última estância para nós próprios.



Olhando do espaço, conseguimos distinguir na Terra miríades de pontos luminosos na superfície. Uns são facilmente preceptiveis como sendo cidades. Porém, uma parte substancial são impressões digitais de crimes. Não são mais do que queimadas realizadas nas zonas florestais do planeta.

Cada ponto luminoso, das centenas que podem ser avistados diariamente, corresponde à pira funerária de milhares de árvores, em queimadas megalómanas, patrocinadas por empresas petrolíferas como a Shell.

A destruição das florestas naturais e a libertação de grandes quantidades de dióxido de carbono pelos automóveis e máquinas afins que utilizamos, têm vindo a intensificar a concentração deste gás na atmosfera.

Como consequência, temos vindo a assistir por todo o planeta ao chamado aquecimento global: um aumento da temperatura média superficial global que se têm registado nos últimos 150 anos.


Especialistas alertam num relatório encomendado pelo governo britânico (publicado na edição de 31 de Outubro de 2006 do Jornal de Notícias), que mesmo que a poluição acabasse agora, os gases com efeito de estufa continuariam a aquecer o clima durante mais de 30 anos e o nível dos mares subiria durante mais um século:

(…) O Mediterrâneo vai assistir a um aumento do stress hídrico, ondas de calor e fogos florestais. Portugal, Espanha e Itália serão os países mais afectados. O derretimento das neves alpinas e precipitações extremas podem aumentar a frequências das cheias nas principais bacias hidrográficas como as do Danúbio, Reno e Ródano. Muitos países costeiros em toda a Europa serão vulneráveis à subida do nível do mar (…)”.

Neste mesmo artigo, um especialista da cidade do Porto em alterações climáticas alerta:

(…) Estamos a mudar a composição da atmosfera, ao emitir mais gases com efeitos de estufa, especialmente dióxido de carbono. Se esta tendência continuar, e tudo indica que sim, vão ser cada vez mais prováveis ondas de calor, com valores de temperatura acima do usual. São estas alterações que explicam fenómenos de chuva como os que se passaram há dias no país (…)”.

A natureza sempre encontrou soluções para resolver estas encruzilhadas... a bem ou a mal!

A questão que se coloca é que a resolução que este problema apresenta pode resultar ou na nossa evolução enquanto seres humanos, para uma espécie cada vez mais consciente do seu potencial, não usando a inteligência como uma arma nas mãos de uma criança; ou os nossos monumentos ao consumismo e à arrogância da nossa cobiça, construídos sobre os cadáveres de outras espécies do planeta, acabarão por desabar sobre nós...

O momento é crítico, o tempo é escasso... O planeta que tudo nos deu, tudo nos pode retirar.

Nós pertencemos à Terra, e a Terra não pertence a nós.


E transcrevendo as palavras de Carl Sagan no seu livro “Biliões e Biliões”, sobre esta Terra em que vivemos:

(…) As nossas vidas futuras dependem daquilo que lhe damos, e como a trata-mos.Nós que só cá estamos há cerca de um milhão de anos fomos a primeira espécie a descobrir formas de se auto destruir.Somos raros e preciosos por estarmos vivos, por pensarmos tão bem como pensamos. Temos o privilégio de influenciarmos e talvez controlarmos o nosso futuro.É nossa obrigação lutarmos pela vida na Terra – não apenas por nós, mas também por todos aqueles, humanos e outros, que vieram antes de nós e para os quais estamos em dívida e por todos aqueles, se tivermos juízo, que virão depois. Não há causa mais urgente, nem dedicação mais adequada, do que a protecção do futuro da nossa espécie. Quase todos os nossos problemas são causados por seres humanos e podem ser resolvidos por seres humanos (…)”.

Nenhuma convenção social, nenhum sistema político, nenhuma multinacional vai impor as opções que fazemos na nossa vida.


Levanta-te cedo.

Dá uma corrida.

Toma um banho no mar.

Dá um salto ao jardim.

Passeia com as crianças.

Usa o transporte público.

Usa a bicicleta.

Não colabores com a poluição da tua cidade.

Não colabores com os atentados ambientais causados pelas petrolíferas.

Sente-te vivo.

Sente-te saudável.

Não precisas do ginásio.

Descobre o mundo maravilhoso que se esconde na tua cidade: as pessoas; a cultura; a natureza.

Se o homem anda atrás do paradigma do paraíso perdido é altura de o encontrar em si mesmo em consonância com a natureza.

Olhemos à nossa volta e veremos quanto temos perdido por não termos aberto o coração e a mente ao mundo maravilhoso que nos rodeia.

Monday, October 30, 2006

Memórias de um rio vivo ...










Memórias de um rio vivo ...


Li um artigo sobre o rio Mondego. Esse mesmo rio que utilizei como exemplo para uma reflexão sobre os rios e os planos hidrológicos humanos que os têm vindo gradualmente a transformar em canais amorfos e sem vida, sem fulgor e poesia ... sem vida e esplendôr ... o rio Mondego, o maior nascido em Portugal, é um rio triste, muito triste ...


Perto do centro, onde saio todos dias do autocarro 16, verificámos os horários dos autocarros, que são escrupulosamente cumpridos, e constatámos que teríamos de esperar cerca de 16m pelo autocarro, pelo que decidimos ir a pé. Seguimos pelo percurso que começa a ser para mim rapidamente familiar e conhecido. Ao chegamos perto de casa, a Radka, um nome mais ou menos comum na R.Checa, falou-nos de um amigo que habita nuns “panelakis” na área. Contou-lhe que onde agora se estende uma longa avenida asfaltada antes corriam livres e sinuosas as águas do Morava. Agora o Morava assemelha-se em larga medida a um canal agrilhotinado por diques, um canal uniforme sem vigor e espontaneidade. As margens que havia visto antes são morros de terra erguidos pelo Homem. Esses diques fazem parte de uma espécie de sistema de controlo e manipulação de caudais. Suponho que seria necessário indagar pelo Morava na sua essência para se poder estimar de forma mais exacta o verdadeiro impacto de tal intervenção. Mas parece-me triste o Morava, castrado e ferido no seu orgulho. De resto não muito diferente do mesmo processo pelo qual passou o Mondego, e um plano hidrológico que quase lhe roubou toda a essência e vida. Aqui como lá, mais do que uma ideologia de comité central ou de mercado, o que é mais importante é a forma como os Homens olham para a Natureza. Não como um pássaro que deve voar livremente e preencher o nosso céu de poesia e liberdade, com o qual se aprende a conviver e respeitar, mas como um animal selvagem que se deve açaimar e domesticar como num luminoso mas triste espectáculo de circo qualquer.


in Pereira, Pedro Jorge; “Be the Change you Want to See - uma outra perspectiva do mundo através do voluntariado”, (Porto, Planeta Terra: GAIA, 2006) p. 70



Mondego entra na lista das 200 "zonas mortas"
Fertilizantes e pesticidas tiram a respiração às águas dos rios
http://jn.sapo.pt/2006/10/22/sociedade_e_vida/mondego_entra_lista_200_zonas_mortas.html
Eduarda Ferreira

Orio Mondego está incluído numa lista de zonas aquáticas em que falta o oxigénio e, por isso, são consideradas "zonas mortas", pelo menos durante parte significativa do ano. De 149 sítios com esta classificação em 2004, a lista organizada pelo Programa de Acção Global para a Protecção do Ambiente Marinho de Fontes Localizadas em Terra integra agora cerca de 200.

O Programa das Nações Unidas para o Ambiente (UNEP) actualiza de dois em dois anos o relatório de uma sua iniciativa que faz o diagnóstico dos meios aquáticos costeiros e marinhos. Na reunião desta última semana, em Pequim, saíu o consenso sobre a actualização dos sítios doentes, cuja lista definitiva só será divulgada em 2007. De qualquer modo, o rio Mondego foi já citado como um dos casos incluídos no último relatório.

Um pouco por todo o mundo estão identificados recursos hídricos que passaram a "zonas mortas". A asfixia dessas águas deve-se a lixo, a descargas de estações de tratamento, à construção de barragens, ao turismo, à indústria e transportes. A agricultura é fonte importante de poluição localizada em terra. Ao enviar para os rios fertilizantes (nomeadamente o nitrogénio e o fósforo) determina a eutrofização das águas, que se caracteriza pelo desenvolvimento descontrolado de algas consumidoras do oxigénio. Tal impede, por exemplo, que espécies piscícolas subsistam nesse meio. Os pontos negros deste mapa das Nações Unidas incluem desde zonas das Caraíbas a fiordes da Noruega, Mar Negro, Austrália, China e Japão. O Mediterrâneo é dos que concentram mais manchas de poluição. Por exemplo, a Leste do Algarve, são visíveis efeitos da actividade turística e da produção agrícola intensiva na Andaluzia, Espanha. Cerca de 80% da poluição do mar e estuários têm origem em terra.


Friday, October 27, 2006

shell demonstra hipocrisia no prémio "vida selvagem"
















Um dos temas referidos no livro “Be the Change ... “ sobretudo quando abordada a questão da globalização, prende-se com as proporções que o crescente “poder” das companhias multinacionais tem vindo a adquirir na “nova ordem neoliberal” ... dotadas de uma poderosa máquina de propaganda, de hábitos consumistas e “inconscientes” generalizados à quase totalidade da população mundial (exceptuando os que deles são excluídos não tanto por opção mas por impossibilidade prática, e não são poucos), e no âmbito de uma “globalização” que mais não é que do que o seu jogo de monópolio jogado à escala global e à escala da vida de todos nós ... uma silenciosa e subtil “revolução” mercantilista tem vindo a reconfigurar toda a escala de valores da nossa sociedade. Por detrás desse aparente manto de “normalidade” e placidez, escondem-se complexos e obscuros jogos de interesse ... capazes de prejudicar, até mesmo destruir, a vida de milhões, biliões, de seres em todo o planeta ... habitats inteiros até ...

No mundo neoliberal existe uma ordem primordial antes de todas as outras: O LUCRO. E tudo o mais nada mais são do que meros “acessórios” circunstânciais que adquirem até o carácter de estimulante desafio para os especuladores bolsistas e malta da política amigalhaça ... e o que mais não faltam são “amigos”, amigos do dinheiro ...


Friends of the Earth International
SHELL DEMONSTRA HIPOCRISIA NO PRÉMIO "VIDA SELVAGEM"
Londres, Reino Unido, 18 de Outubro de 2006


As comunidades que vivem junto à gigante petrolífera Shell vão esta semana expor a hipocrisia da empresa ao patrocinar o prémio da competição Fotógrafo do Ano da Vida Selvagem – anunciado quarta-feira, dia 18 de Outubro (1).

A Shell é a nova patrocinadora do prestigiado prémio, que é organizado conjuntamente pelo Museu de História Natural e pela BBC Wildlife Magazine, e contribuiu com cerca de € 1,117,000 (2).

Mas os vizinhos da Shell designam a gigante petrolífera de “destruidora da vida selvagem” e afirmam que está a tentar esconder os estragos que faz na vida selvagem e no ambiente por detrás do prestigiado prémio (3).

Estão a reclamar para que o Museu de História Natural termine a relação com a Shell, que acreditam danificar a reputação e credibilidade do museu. O museu participa na competição apesar de ter um relatório ético sobre a Shell que identifica problemas na companhia.

Paul De Clerck, da Campanha de Empresas da Friends of the Earth, afirma: “O patrocínio da Shell ao prémio de Fotógrafo do Ano da Vida Selvagem desvaloriza completamente o seu valor. A Shell está a causar danos massivos à vida selvagem e ao ambiente, e nenhuma quantia de patrocínios em prémios verdes irá mudar isso.”

Hannah Griffiths, também da Campanha de Empresas da Friends of the Earth, acrescentou: “O Museu de História Natural não devia aceitar patrocínios duma companhia tão destrutiva”.

Os visitantes, que falaram em eventos públicos em Londres, Birmingham e Manchester, e que visitaram os Parlamentos (5), estão no Reino Unido para chamar a atenção para o impacto real da Shell sobre a vida selvagem, o ambiente e os povos de todo o mundo.

Um dos oradores é Terry Clancy, da campanha Shell para o Mar do Condado Mayo, na Irlanda, onde a Shell planeia construir um pipeline off-shore e terminais de gás. O desenvolvimento ameaça o habitat único proporcionado pela Baía de Broadhaven – uma reserva natural internacional importante – e destruirá turfas e pastos costeiros (6).

Os oradores sublinham também os impactos negativos na vida selvagem da ilha russa de Sakhalin, onde a nova plataforma e pipeline da Shell ameaçam a sobrevivência da já gravemente ameaçada Baleia Cinzenta do Pacífico Oeste.

A Friends of the Earth viu também detalhes dum relatório que afirma que a Shell destruiu várias centenas de abetos de Sakhalin, ou abetos de Glehn – incluidos na lista de espécies ameaçadas da IUCN. Parte de uma área protegida de um quilómetro de comprimento foi arrasada pela Shell para dar lugar ao pipeline (7).

A Friends of the Earth, que está a servir de anfitriã desta acção, lançou uma galeria de imagens que mostram os estragos causados pela Shell (8).

http://www.foe.co.uk/campaigns/corporates/news/shell_wildlife_gallery.html e http://www.shelloiledwildlife.org.uk


PARA MAIS INFORMAÇÕES CONTACTE:

Friends os the Earth International Corporates Campaigner Paul De Clerck.

Tel: +32-2-542 61 07 (número belga)

Friends of the Earth's Corporates Campaigner Hannah Griffiths.

Tel: +44-7855 841994

Friends of the Earth Press Office em Londres. Tel: +44-20-7566 1649

(1) Ver www.nhm.ac.uk/visit-us/whats-on/temporary-exhibitions/wpy/exhib-index.html

(2) A shell contribui com £750,000 em dois anos, conforme o acordo assinado com o Museu de História Natural.

(3) Um relatório sobre os impactos da Shell na vida selvagem está disponível na página da Friends of the Earth www.foe.co.uk/resource/briefings/shell_wildlife_destroyer.pdf

(4) Uma cópia da revisão ética está disponível aos Friends of the Earth

(5) Os vizinhos da Shell falaram em Londres a 16 de Outubro às 19.00 no London Action Resource Centre, 62 Fieldgate Street, London E1 1ES; terça-feira 17 de Outubro às 18.30 no Imperial College, Lecture Theatre 208, Skempton Building, Imperial College Road, London SW7; em Birmingham na quinta-feira 19 de Outubro às 19.30 no Warehouse Café, Birmingham Friends of the Earth, 54-57 Allison Street, Digbeth, Birmingham, B5 5TH; e em Manchester na sexta-feira 20 de Outubro às 19.00 no Friends Meeting House.

(6) Ver http://www.corribsos.com/

(7) Uma cópia traduzida está disponível na Friends of the Earth

(8) Ver http://www.foe.co.uk/campaigns/corporates/news/shell_wildlife_gallery.html e http://www.shelloiledwildlife.org.uk


Tradução: David Maia

Thursday, October 19, 2006

Uma verdade inconveniente ...






Uma verdade inconveniente ...

http://www.climatecrisis.net/


Uma verdade inconveniente tem, sem dúvida, uma elevada componente pedadógica e, na verdade, funciona como um mais que pertinente grito de alerta para a caixa de pandora que a nossa sociedade tem vindo a abrir com o nosso estilo de vida consumista e insustentável, sendo que neste filme é abordado de forma particularmente interessante o fenómeno do Aquecimento Global e as suas repercussões no nosso planeta e em toda a forma como se estruturam as sociedades humanas.

Al Gore tem inequivocamente uma capacidade de comunicação extremamente bem desenvolvida e demonstra, a certos níveis, uma sensibilidade algo inesperada se considerarmos que estamos a referir-nos a um potencial ex presidente dos Estados Unidos da América. É quase inevitável perguntarmo-nos como foi possível George Bush ter derrotado Al Gore, que grau de insanidade mental, ou dúbios esquemas eleitorais, foram utilizados de forma a ter sido propiciado tamanho trágico episódio. De qualquer das formas, gosto de acreditar que essas são questões algo laterais no contexto da película, cujo mérito se situa muito mais ao nível de ser um imprescindível documento de denúncia que nos revela uma terrível realidade, “estranhamente” ausente da “agenda política” e dos debates da nossa sociedade. Ausente também dos boletins informativos, com a excepção feita às catástrofes climáticas que se, por um lado, “oferecem” cada vez mais imagens espectaculares às audiências famintas de imagens “sensacionais”, por outro lado, são cada vez mais comuns e até banais face à forma brutal como o “Homem” parece ter já danificado o equilíbrio ecológico do Planeta Terra. Creio que é essa uma das principais virtudes do filme: proporcionar-nos uma real dimensão dos fenómenos que estão a ser desencadeados assim como a amplitude dos seus impactos. E creio que poucos de nós tínhamos (temos) noção da gravidade da situação e do que está para suceder em breve no nosso planeta, do que já está a suceder no nosso planeta, com tudo o que isso vai significar ...

Existe uma ignorância quase generalizada em relação a um fenómeno que está, de forma cada vez mais inequívoca, a reconfigurar todos os padrões biológicos desse habitat global que é o nosso planeta, com todas as suas dramáticas consequências ...

Uma Verdade Inconveniente” é talvez um contributo muito importante e susceptível de ajudar a reverter um pouco esse estado generalizado de inconsciência e talvez um bom incentivo para que nós, comuns cidadãos, possamos adoptar práticas e estilos de vida que não contribuam, à sua escala, para o agravamento de fenómenos como o aquecimento global ... já para não mencionar tudo o que podemos fazer como cidadãos activos e com todo o direito moral de exigir viver num Planeta Terra livre de poluição e estupidez humana. Por estupidez entenda-se, sobretudo, essa obstinação de muitos seres humanos em (ab)usar (d)os recursos do planeta, e causar impactos ambientais nos ecossistemas, ao ponto de causar nestes uma situação de quase total destruição inviabilizando a própria vida.

Um filme a ver e aconselhar. Muito importante.

(revisão ortográfica: Cristina Gomes)


Uma Verdade Inconveniente

Título original: An Inconvenient Truth

De: Davis Guggenheim

Género: Doc

EUA, 2006, Cores, 100 min.

argumento

Documentário que tem como figura condutora Al Gore, o antigo Vice-presidente dos Estados Unidos, que depois da sua derrota nas eleições de 2000 voltou à sua cruzada de ajudar o planeta. Segundo alguns cientistas, teremos apenas dez anos para evitar uma grande catástrofe que pode destruir o nosso planeta gerando condições meteorológicas agressivas, inundações, epidemias e ondas de calor que ultrapassam tudo o que conhecemos. O documentário segue a luta de Al Gore para travar o aquecimento global e a sua tentativa de impor o problema, não como uma questão política, mas sim um desafio global para a Humanidade.


The truth is coming soon to a theater near you: Al Gore’s New Global Warming Movie “An Inconvenient Truth” [en]

Al Gore’s critically-acclaimed new film “An Inconvenient Truth” offers the best opportunity we’ve ever had to capture the immediate attention of all Americans and move this country forward quickly to stop global warming. While the problem is urgent, the solutions are clear, and with American ingenuity and leadership, we can avert disaster and restore the world’s confidence in our values. Let’s work together to make this movie a success, and turn the audience interest into action.

One easy way to get involved as virtual marchers is to buy a ticket and bring a friend to see this movie. Then help spread the word. The more people go see this movie on opening weekend, the more theaters will pick it up. Bring the power of the Virtual March to movie theaters across the country.

Marching forward,
Robert F. Kennedy, Jr.